terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Escola Nova

        O conceito de Escola Nova é normalmente relacionado com conceitos como “educação centrada na criança” e “autonomia dos educandos”. Historicamente surgiu no período do Iluminismo. Emergiu num contexto de grandes desenvolvimentos, como o industrial, que emergiu de forma muito rápida, ocorriam grandes transformações políticas, sociais e sobretudo cientificas, e neste sentido era preciso criar uma escola que desse resposta às revoluções, políticas, sociais, económica, cientifica e técnica do século de oitocentos. A Escola Nova apresentou-se como um movimento que tinha como grande ideal reconhecer a necessidade de mudar o mundo através da educação dos mais novos. Através de uma educação nova seria possível criar um Homem Novo que desse respostas aos tempos modernos que se viviam.
            Estas transformações dotaram os homens de um otimismo e romantismo quanto às suas potencialidades, quanto ao poder da razão humana. Derivado a este otimismo os homens encararam o progresso como algo adquirido, começaram a acreditar na evolução natural do homem. Este otimismo começa a refrear-se com a entrada no séc. XX e sobretudo com a 1ª Grande Guerra e uma industrialização acelerada, onde se começou a instalar uma depressão e pessimismo na generalidade das pessoas. Sentiu-se a necessidade de salvar a humanidade por meio da educação, criar um novo homem, para esquecer as causas da guerra. Isto fez com que surgisse nas pessoas a preocupação de criar um mundo novo e melhor. A forma de encarar a educação por parte dos defensores deste movimento é a de entrar em rutura com aquilo que se designou de educação tradicional. Face aos tempos modernos que se viviam, os defensores da Escola Nova tinham consciência de que era preciso alterar o mundo, e essa mudança só era possível através da educação dos mais novos, era necessária uma nova educação e uma escola nova face à anterior, só assim se poderia proporcionar a criação de um Homem Novo.
            Os precursores deste movimento encontram-se desde a antiguidade, como Sócrates, Platão ou S. Agostinho, passando por Erasmo, Montaigne, Coménio ou Locke. Contudo, é com J.J. Rousseau que os ideais da Escola Nova começaram a ser verdadeiramente alicerçados. Com Rousseau começa-se a olhar de forma diferente para a criança, o seu estatuto é alterado. Esse foi um dos fatores que impulsionou o surgimento da Escola Nova. Outro fator prende-se com o aparecimento e o desenvolvimento de várias ciências humanas e sociais, as ciências como psicologia (Piaget), a sociologia ou a psicanálise colocaram o homem, também ele como objeto de estudo científico e experimental. Estas ciências possibilitaram um conhecimento mais profundo das crianças, o que levou a uma conceção nova de infância. É a partir destes dados que se dá com a Escola Nova aquilo que Dante Morando chamou a “revolução copernicana da educação”, uma vez que o conceito de educação, infância, escola, ensino e professor foram completamente metamorfoseados.
            Na escola dita tradicional, os métodos de ensino eram baseados num sistema de regras rígidas, o papel dos professores era o de produzir “cidadãos em série” prontos a entrarem para as fábricas, as escolas não tinham interesse em formar indivíduos com sentido crítico, ensinava-se apenas o indispensável para se ter bons operários. Algumas características da escola tradicional eram; o enciclopedismo, o didaticismo, o formalismo, o autoritarismo, o individualismo e o elitismo. A pedagogia tradicional era encarada como fortemente punitiva, quer fisicamente quer psicologicamente. O objetivo da Escola Nova era tornar-se o oposto daquilo que foi a escola tradicional, a escola de massas. A escola tradicional era vista como uma pedagogia anti-natural, uma vez que através da força se tentava moldar as mentes que na sua origem eram puras e boas. A Escola Nova, ao contrário da escola tradicional, mantinha um otimismo quanto à natureza humana. Ao contrário da escola tradicional, a Escola Nova pretendia ser arejada, doce, enfim, um local onde as crianças se sentissem felizes e livres. A escola tradicional centrava a sua atenção na escola e no professor, a Escola Nova pretendia criar um modelo centrado na criança, na sua psicologia e dando ênfase aos seus níveis de desenvolvimento intelectual e afetivo, isto é, uma educação que viesse do interior para o exterior e não do exterior para o interior, só assim poderiam criar um homem novo e um mundo melhor. A pedagogia nova encontra-se no oposto do enciclopedismo da pedagogia tradicional.
            O movimento da educação nova encontra as suas raízes em Rousseau. Rousseau nasceu no séc. das luzes, movimento caracterizado pela submissão à razão. O movimento iluminista é posto sobre o signo da luz, da razão. O iluminismo ficou marcado pelas ideias de emancipação, progresso e perfectibilidade. O conjunto destas ideias contribuíram para a formação de um homem novo, e estas ideais chegaram e influenciaram também a pedagogia. O séc. XVIII vê o progresso da razão como o seu maior triunfo. A ideologia de progresso está presente em todos os setores da sociedade. Naturalmente esta ideia de progresso apoia-se na ideia de que a razão não só é capaz de conhecer melhor o mundo, mas também de controlar melhor a natureza que deve estar ao serviço dessa mesma razão. Rousseau nasce neste séc. de grandes transformações e mudanças, sendo influenciado pelas ideias das luzes. Com a obra O Emílio ou a Educação, Rousseau influenciou determinantemente o modo de pensar a pedagogia. Com Rousseau dá-se a viragem de uma conceção de educação magistrocêntrica para uma conceção pedocentrica. A primeira conceção via a criança de forma pessimista, a criança era naturalmente má, a criança era como um homúnculo, um homem mas em tamanho pequeno, desta forma, a educação não carecia de cuidados especiais. Com Rousseau esta perspetiva alterou-se, segundo Rousseau as crianças são naturalmente puras e boas “tudo é perfeito quando sai das mãos de Deus, mas tudo se corrompe nas mãos do homem”. A criança deveria ser educada de forma a promover e desenvolver as suas plenas capacidades, respeitando a sua individualidade. A educação deveria manter a criança longe da influência da sociedade que a rodeia, de forma a ela se afirmar a si mesma e não como um cidadão que está numa sociedade que a corrompe, era necessário manter a criança longe dos artifícios sociais. Deixar a criança ser criança antes de ser adulto. No Emílio, Rousseau fornece um guia de como educar uma criança desde o seu nascimento até à idade da razão. Os defensores do movimento da Escola Nova encontraram no Emílio algumas ideias e atitudes que estiveram na base da sua teoria pedagógica. Os educadores da Escola Nova retiraram de Rousseau a forma de pensar a criança e a educação, realçando a especificidade do mundo infantil face ao mundo dos adultos, dar mais importância ao desenvolvimento das crianças, a conhecê-las melhor, para desta forma chegar melhor ao seu mundo e necessidades. Também de Rousseau retiraram a forma de ensinar, que devia ser centrada num ensino livre, sem castigos, ou seja, um ensino que fosse natural e não anti-natural como sucedia. Para os pedagogos da Escola Nova, foi como se Rousseau tivesse adivinhado as enormes transformações que a Revolução Industrial iria provocar nas sociedades, nas pessoas e no mundo.
            A Escola Nova caracteriza-se assim por privilegiar um retorno à natureza, ao que é natural, retirando a criança da influência nefasta da sociedade, da família, de forma que a criança cresça livremente. Os pedagogos da Escola Nova colocaram a criança, o aluno, como principal preocupação educativa, a preocupação já não era o que as crianças devem aprender, mas antes o que podem aprender. As crianças já não são vistas como homúnculos, já não estão na escola apenas como recetores e espetadores, mas passam a ter um papel ativo e criativo. Valoriza-se as necessidades e os interesses naturais próprios das crianças tendo em conta as suas fases de desenvolvimento e crescimento, tendo sempre em conta a individualização da criança. O professor deixa de ser um transmissor de conhecimento para ser um orientador dos alunos, estimulando-os e incentivando-os conforme as capacidades de cada aluno. Em suma, o grande ideal da Escola Nova era uma educação centrada na criança, “a escola é para a criança e não a criança para a escola… reitera-se a ideia de que só se deve agir em relação à criança desde que esta exprima uma necessidade natural, ou seja, intervir só no momento adequado e de acordo com o seu centro de interesses” (Araújo, 2004:33), tratar a criança como um fim e não como um meio. Podemos dizer que a proposta de educação da Escola Nova retomava a grande preocupação de Montaigne, que era a de “formar cabeças bem feitas e não cabeças bem cheias”.

        Ricardo Carvalho